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Filmógrafo 1999

Primeiros Passos

Estávamos em 1987. Cada um de nós dava o tempo livre de que dispunha, em "A noite saiu à rua" ninguém recebeu um tostão pelo seu trabalho, era a nossa aposta, a nossa vontade de fazer alguma coisa. No final e sem contar, com remunerações para ninguém, este filme custou-nos cerca de 600 contos, o que era uma soma avultada para as nossas posses, tanto mais que não contámos com apoio de ninguém, saiu-nos tudo do bolso e do suor. Este filme foi apresentado no Cinanima'87, onde obteve uma menção honrosa e onde foi visto pelo Mário Dorminsky, Director do Fantasporto que, na altura, nos encomendou um genérico de abertura para a próxima edição do seu Festival e que se manteve durante 9 edições do Fantasporto. Este genérico já não nos trouxe despesas, visto que o Mário disponibilizou 150 contos e conseguiu apoio da Tobis para a filmagem e laboratório. No entanto, as pessoas que nele trabalharam continuaram a não receber um tostão mas, pelo menos, já não tivemos despesas o que já não era mau, era a nossa evolução lenta. Na sequência da presença de "A Noite" no Festival de Zagreb'88 tivemos a encomenda para fazer cerca de 15 segundos de animação para ilustrar um artigo da Declaração Universal dos Direitos do Homem, que seria projectado durante os primeiros mega concertos mundiais sobre os Direitos Humanos promovido pela Amnistia Internacional em 1989. Este foi o primeiro trabalho verdadeiramente remunerado que tivemos.

Continuávamos, no entanto, a ser todos amadores e a trabalhar só nos tempos livres e assim continuámos até finais de 1991.

 

Principais Trabalhos

"Os Salteadores", um projecto que já vinha desde 1986, mesmo antes de "A noite saiu à rua" e que tivera mesmo um prémio em Annecy enquanto projecto, que tinha visto todos os seus pedidos de apoio sempre negados, vimo-nos forçados a mantê-lo na gaveta durante 5 anos, à espera que a Direcção do IPC e abandonasse a sua política absurda de não financiar curtas metragens durante os cerca de 15 anos que o Dr. Salgado Matos esteve à frente do IPC e que a nova Direcção se resolvesse a reconhecer o direito de existência às curtas metragens e à animação.

 

"Os Salteadores" conseguiu uma projecção Internacional invejável para um filme português, com 14 prémios de onde se destacam: o Prémio Especial do Júri do Cinanima'93, o Prémio Especial do Júri Cartoon d'Or'94 e os principais prémios em Valladolid e na Bahia. A aceitação Internacional deste filme fez consolidar os apoios nacionais à animação e veio trazer uma nova força a esta nova geração de animadores portugueses.

As dificuldades de execução sentidas durante a produção levaram-nos a fazer, logo a seguir, uma acção de formação para o que contámos com a colaboração estreita de um estúdio francês - Lazennec Bretagne - o qual se debatia com dificuldades idênticas às nossas. Neste estágio participaram os principais animadores de "Os Salteadores" e foi orientado por cerca de 40 profissionais nacionais e estrangeiros. Durante os 9 meses de curso foi possível fazer vários pequenos filmes em desenho e volume animado de onde destacamos o "Ovo" de José Miguel Ribeiro e Pierre Bouchon, galardoado com 4 prémios Internacionais, incluindo o "Prix à la Qualité C.N.C. 1997" e o projecto de filme posteriormente reformulado de "A Noite", que a Regina Pessoa se encontra neste momento a concluir a sua realização.

 

Mas gostamos de variar, de experimentar novas maneiras diferentes de fazer filmes e, se muita gente esperava que fizéssemos sequelas de "Os Salteadores", foi certamente surpreendida pelo "Fado Lusitano" realizado com objectivos e uma técnica muito diferentes. O "Fado Lusitano" foi uma "encomenda" do John Hallas para integrar uma série que ele pretendia fazer sobre os Europeus – cada país faria o seu próprio auto-retrato animado em cerca de 5 minutos. Tivemos de fazer uma grande pesquisa, chatear meio mundo para tentar descobrir como era o humor Português e como é que nós próprios nos víamos. E foi neste contexto que surgiu o "Fado Lusitano.

 

Ao mesmo tempo Pedro Serrazina realizava a sua "Estória do Gato e da Lua", utilizando uma linguagem poética e universal que lhe tem garantido um enorme sucesso pelo mundo fora, atestado pela obtenção de 15 prémios, de onde destacamos dois prémios no Cinanima'95 e os principais prémios em Valladolid e Bahia, a participação a concurso no Festival de Cannes e como finalista do Cartoon d'Or. Actualmente o Pedro encontra-se a preparar o seu novo projecto “Os Olhos do Farol”, depois de 2 anos a estudar no Royal College of Art  em Londres.

 

Também incluído nesta política de abertura e de apoio às experiências de Animação apoiámos a finalização do filme "A Religiosa", de Clídio Nóbio que, sendo um trabalho controverso, tanto amado como odiado, tem solicitado um grande interesse quer na vizinha Espanha quer nos Estados Unidos.

 

1996 foi um ano de reflexão, de reestruturação, de redimensionamento e equação do nosso papel no seio do cinema de animação. O mercado dos filmes de curta duração, e em especial dos filmes animados para um público mais adulto, é o mais difícil de todos os mercados do audiovisual e tem sido, até hoje, impossível de recuperar os investimentos realizados nestes filmes. Apesar do seu relativo sucesso internacional, ainda não foram comercializados em Portugal. Se é verdade que alguns prémios nos trazem vantagens económicas, também o é que estas são poucas e manifestamente insuficientes, cobrindo praticamente as despesas que temos com o envio de filmes para os diversos festivais. Mesmo assim "Os Salteadores" propiciaram mais receitas através dos prémios obtidos do que através das vendas, o que é obviamente uma situação insustentável na ausência de subsídios. Somos subsídio-dependentes? Somos sim! E não vejo outra possibilidade a curto, médio ou mesmo longo prazo, quer em Portugal, quer na Europa quer em outra parte qualquer do Mundo, enquanto não forem criados, desenvolvidos e devidamente apoiados circuitos comerciais onde estes filmes possam encontrar o seu público (que estamos convencidos que realmente existe)!

 

Os dois anos seguintes foram determinantes para a situação actual vivida pela Filmógrafo, tendo particular relevância os segmentos de animação, encomenda da RTP (pelo seu Departamento de Programas Infantis), do programa “Jardim da Celeste” (1ª e 2ª séries), quer como campo de ensaio e descoberta de novos animadores e realizadores quer como fonte de receitas, permitindo encetar um saneamento financeiro da casa. No entanto, estas animações obtiveram um relativo reconhecimento, quer nacional quer internacional sendo exemplo dessa situação o “Gatofone” do Pedro Serrazina, “Transformações” do André Marques e “A Casa do João” de Daniela Duarte Rui os quais foram distinguidos pelo Cinanima (1997-98) e têm sido constantemente convidados a integrar a selecção de diversos festivais. Títulos como “Neste Natal eu queria...” e “As pombinhas da Catrina” de Graça Gomes, “Abecedário” de André Marques e “A Lebre e o Hipopótamo” e “O Macaco e a Tartaruga” de Manuela Bacelar, integrados na 2ª série do “Jardim da Celeste”, são outros dos títulos produzidos e que tem tido uma presença em festivais bem maior do que a esperada para filmes deste género.

 

Outro factor positivo neste processo de crescimento e maior abertura do estúdio foi a edição em vídeo da “INQUIETAÇÕES – 10 anos de animação da Filmógrafo”, uma colectânea dos trabalhos mais significativos, por altura do 10º aniversário da Filmógrafo (Outubro de 1997) complementada com uma sessão no Rivoli.

 

Como corolário deste volume acrescido de trabalhos foi possível sustentar o gradual crescimento do estúdio conducente aos seis projectos de autor agora em produção: “A Noite” de Regina Pessoa (em fase de conclusão), “Clandestino” de Abi Feijó, “Intertícios” de Marina Estela Graça, “Café” de Alex Cão e João Fazenda, “Cães, Marinheiros” de André Ferrão e Joana Toste e “Os Olhos do Farol” de Pedro Serrazina.

 

Por último, a “grande empreitada” da Filmógrafo – a “Casa da Animação” – um projecto que para além da importância do papel a desenvolver no âmbito do cinema de animação é também um passo em frente no que respeita ao trabalho de formação e divulgação da animação desenvolvido pela Filmógrafo ao longo destes doze anos de actividade.


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