Texto para Catálogo Filmógrafo
Em julho de 92 apareci com alguns desenhos debaixo do braço, à procura de trabalho. No dia seguinte tinha um dos personagens principais d' Os Salteadores para animar. E desde esse dia a Filmógrafo tem sido a minha casa. Acolheu-me, adoptou-me e a animação passou a ser passou a ser, mais que a minha profissão, a minha opção de vida.
Por profissão entendo algo que as pessoas fazem das 9 à 5 e fazem-no porque têm de sobreviver. Depois, quando o dia acaba, sentem alivio e correm para casa para, enfim, viverem a sua verdadeira vida.
A opção de vida que me refiro é quase como fazer um voto ou seguir um ideal, implica aceitar uma situação profissional que poderá condicionar toda a nossa vida pessoal, invadindo-a, limitando-a, afectando-a.
Trabalhar no Filmógrafo significa aceitar uma situação financeira frágil, um futuro incerto, suportar muito frio no Inverno e muito calor no Verão, entrar em pânico porque chove em cima dos desenhos e dos equipamentos, acotovelarmo-nos uns aos outros porque parece que o espaço está a encolher. Significa ainda esforçar-se por se manter acordado, porque às vezes o dia entra pela noite dentro, outras vezes o fim de semana não chega a existir.
Muitas vezes atravessam-se crises, surgem-nos dúvidas e interrogações, apetece-nos parar e abandonar tudo.
Então, porquê continuamos?
Há alguém fundamental, que praticamente se confunde com o estúdio e que me ajudou a encontrar a resposta: quando me surgem dúvidas penso em algo que o Abi me disse um dia: " Se achares que tens algo a dizer, confia em ti, luta por isso. Se isso for realmente importante para ti, dedica-te com paixão e essa entrega notar-se-á no resultado final. E as pessoas que virem o filme, de alguma forma, sentirão isso também."
Foi o ensinamento mais importante que aprendi até hoje e penso que me irá ser útil pela vida fora.
Assim, este trabalho que por vezes exige entrega e sacrifícios, tem-me devolvido a razão de existir. E é isto que eu quero continuar a fazer.